Dias depois de levar o abanão questionou o seu coração. Como foi possível ter permitido aquela invasão!? Monte Longo deu largas à frustração, gotas de dor deixavam transparecer a grande desilusão.
Assim falava mas não se desesperava, sentia que os braços enormes do divino na alegria ou na tristeza o amparavam. A música, as flores, as silvas, as amoras, até mesmo as pessoas por detrás das máscaras eram para ele encantadoras. Que mais havia de querer? Cada um era o que é! Ponto final. Nada podia fazer. Assim decorriam os dias, sem grandes melhorias. Uns falavam, outros ouviam. Era assim que se entendiam. Detestava quando lhe invadiam a privacidade em nome dessa estúpida vaidade. Desde que Golias, o barão, insistiu em comandar o pelotão, tudo se havia transformado num enorme turbilhão. Ainda assim, no meio de tanta insanidade insistia no defeito de querer que as conversas fossem minimamente inteligentes, tivessem algum fundo de verdade.
O filho do capataz, que conheceu tempos atrás, era bom rapaz, gentil, educado, tinha um bom coração, mas havia caído sobre ele não sabia bem porquê uma grande aflição. A qualquer hora, em qualquer lugar, em qualquer dia por onde se movia um grupo de crianças malfeitoras o agredia. Certo dia, já cansado de os aturar, rogou ao Senhor se o podia livrar, afastar os agressores, para poder sossegar. Quem semeia ventos colhe tempestades, gritou do alto do céu sua majestade. Tens o sol, as estrelas, os rios, as plantas, o mar, sete dias na semana para comer, trabalhar, orar ou amar. Desanimado, o rapaz encurvado ficou lá um bom bocado. Ao fundo da alameda, já seu caminho seguia, levando na sacola as pedras com que se defendia, sentiu bem dentro do peito a luz divina o protegia.
Também ele, Monte Longo, apesar de ser durão agora mais do que nunca precisava de protecção. Desde que Golias chegou que muita coisa mudou. A esperança que tudo alcança se extraviou.
Primeiro foi o raio que caiu na central de alta tensão cortando a luz à povoação. Depois veio a seca que assolou toda região tirando ao mais venturoso a disposição. O calor excessivo nem sequer deixava pensar, a água na fonte já estava a escassear. O único barco, encalhado junto à margem, não podia navegar. Teria que esperar pelas chuvas para poder embarcar. Já não sabia o que fazer, talvez fosse boa ideia fazer o percurso a pé, partir ao anoitecer. Enquanto as feras dormiam, guiado pelas estrelas, descer os altos penhascos, antes de adoecer. Ao chegar perto do lago, apanhar o autocarro que percorre os verdes prados junto ao rio refrescante, saciar a sua sede na fonte de água viva que fica mais adiante.
Filomena Magalhães
Filomena Magalhães
Continuo a gostar.No entanto, afigura-se-me um pouco difícil descodificar esta linguagem "metafórica"!
ResponderEliminarSerá essa a finalidade?
Ou "encapota" vivências pessoais e,como tal, pretende "espicaçar" a imaginação do leitor?
A.Freitas
ResponderEliminarTambem tenho esse receio. A linguagem seja de dificil perceção precisamente pelo uso excessivo de metaforas. No entanto, é assim que sai não consigo escrever diferente.
Espicaçar a imaginação é bom. Gosto de ler textos e ver filmes que me façam pensar.
Agradeço o seu comentario
F.M.